Ei, pessoal. Faz um tempinho hein? 8 meses pra ser mais exato.
Bem, não vou enrolar ou tentar encontrar desculpas pra isso. Realmente faz muito tempo que postei o último capítulo de Chiharu, e reconheço meu erro. Essa é uma história que escrevi há muito tempo, e queria — na verdade ainda quero — reescrevê-la e retrabalhá-la. Este arco em especial é um arco que não pretendo deixar da forma original, então vou acabar fazendo algumas mudanças. Estive ocupado com outros projetos e com a faculdade, mas, como eu disse, isso não é desculpa, então dessa vez prometo que vou dar um gás e postar com bastante frequência, e até o final! E depois, posso apresentar vocês a um dos projetos que tenho trabalhado.
Bem, com alguma sorte, posso acabar aproveitando vocês a mais de um que temos trabalhado, he he he.
Espero que quando o dia chegar possam aceitar isso como pedido de desculpas.
Sem mais delongas, aqui vai o tão demorado capítulo catorze!
Bem, não vou enrolar ou tentar encontrar desculpas pra isso. Realmente faz muito tempo que postei o último capítulo de Chiharu, e reconheço meu erro. Essa é uma história que escrevi há muito tempo, e queria — na verdade ainda quero — reescrevê-la e retrabalhá-la. Este arco em especial é um arco que não pretendo deixar da forma original, então vou acabar fazendo algumas mudanças. Estive ocupado com outros projetos e com a faculdade, mas, como eu disse, isso não é desculpa, então dessa vez prometo que vou dar um gás e postar com bastante frequência, e até o final! E depois, posso apresentar vocês a um dos projetos que tenho trabalhado.
Bem, com alguma sorte, posso acabar aproveitando vocês a mais de um que temos trabalhado, he he he.
Espero que quando o dia chegar possam aceitar isso como pedido de desculpas.
Sem mais delongas, aqui vai o tão demorado capítulo catorze!
Chiharu
Capítulo 14
. . .
— Eu quero cantar.
— ... C-Cantar?
— Quis dizer na sua banda. Vocês estão procurando uma
vocalista, não é?
A garota falou normalmente. Enquanto isso meu coração
palpita a mil no meu peito. Claro que eu estou mais nervoso que ela. Eu que
quase acabei de morrer, não foi? Mas ela deveria estar mais agitada para alguém
que acabou de salvar a vida de outra pessoa.
— Bom, sim... Espere aí, você quer...
Imediatamente a imagem daquela garota em cima do muro,
cantando, me veio a mente. Aquela voz harmoniosa e encantadora que me fez
perder as palavras naquele dia. Se alguém assim se juntasse à banda, com
certeza...
— Incrível! Incrível, Yami-san! É claro que você pode! Só
precisamos falar com os outros!
— Então tudo bem. Só tem uma coisa...
— Claro, o que foi?
— Você ainda está segurando a minha mão.
— Eh..? Ah! Desculpe!
Eu soltei a mão dela rapidamente, só para corar em
seguida. Eu acabei me deixando levar pela emoção e acabei não percebendo isso.
Eu olhei para os pés dela fixamente, sem conseguir encara-la depois disso.
Eu pareço um garoto idiota toda vez que estou perto dela
dessa forma...
Oh, ela tem sapatos bonitos.
— Não tem problema... Mas tem mais uma coisa.
— O-O que é?
Eu nem mesmo levantei o rosto para perguntar, apenas remoí
a saliva na boca esperando pela próxima coisa que eu poderia estar fazendo.
— Seu trem... Está indo embora.
— EEEEEEH!?
Eu me virei bruscamente e olhei para trás. O trem já havia
terminado de descarregar e recarregar um pequeno número de pessoas e agora
estava andando. Eu fiquei ali, de boca aberta como um idiota, observando
enquanto a locomotiva me deixava para trás. Droga... Eu vou chegar atrasado de
novo. Shizuka vai ficar preocupado.
Além disso, eu fiquei parecendo um idiota do lado daquela
garota.
Meus ombros automaticamente se encolheram em resposta à
minha súbita depressão. Meus olhos lacrimejaram. Meu rosto é simplesmente o de
um cara derrotado.
De repente, algo me encheu de vida. Um riso curto, abafado
e feminino que contrastava com a aparência inicialmente intimidadora da garota.
Ela levou a mão até o lábio inferior, se deixando rir um pouco da minha
situação. Eu dei um sorriso torto e cocei a bochecha. Agora que a besteira já
está feita, tenho que pelo menos me sentir satisfeito com o fato de que a fiz rir.
— Então... Pelo visto vou ter que voltar para casa
andando. Vai ser uma boa caminhada...
Eu disse a última sentença mais para mim do que para ela.
Ela olhou para algum ponto à direita dela e voltou a olhar para mim.
— Venha um pouco comigo.
Eu fiquei curioso para saber sobre o que poderia ser, mas
não perguntei nada. Ao invés, preferi ficar imaginando mil e um cenários do que
ela possivelmente queria fazer 'indo um pouco com ela'.
Ah, a juventude.
.
. .
— Aqui.
Ela jogou uma lata de bebida quente que eu precisei usar
as duas mãos para pegar. Eu olhei o que estava escrito no metal. Aparentemente
era algum café expresso enlatado.
— Então era isso...
— Hm? Falou alguma coisa?
— Não, não, nada.
— Está frio. Você não devia sair lá sem algo pra te
aquecer.
— É verdade...
Eu olhei para a lata. Eu não a abri de imediato, apenas
fiquei passando ela de uma mão para a outra para me aquecer.
Pensando nisso, essa garota... Ela esteve me evitando,
dizendo que era melhor não falar com ela. O que mudou, de repente? Agora ela
quer até mesmo entrar na banda... Ela ter me encontrado aqui não foi
coincidência, foi? Então ela me seguiu? A sensação de ser perseguido é um pouco
esquisita.
Embora fosse eu que estivesse fazendo isso com ela não
muito tempo atrás.
Eu abri a bebida e me dei o prazer de leva-la até a boca.
Meu corpo se aqueceu instantaneamente, pareceu que meu corpo todo iria derreter
por dentro. Meu rosto ficou vermelho com a circulação estimulada, e eu sorri
para ela.
— Então, acho que vou indo.
— Já vai? Ah, bem... Tudo bem.
— Cuidado no caminho pra casa.
— Você também...
Eu pensei em me oferecer para deixa-la em casa, mas,
devido às circunstâncias, é melhor que não. Se aquele cara me ver mais uma vez,
ainda mais ao lado da irmã dele, temo que ele não vá usar uma Katana de madeira.
Eu me virei e encarei o caminho gelado que teria que
percorrer até chegar em casa.
Apertei a bebida na minha mão como um guerreiro aperta sua
espada antes do combate e respirei fundo. Descobri que não deveria respirar
fundo.
Gelado...
. . .
Graças a algum milagre, eu não peguei um resfriado ontem.
O sinal tocou, finalizando a última aula. Hoje eu teria
que trabalhar na limpeza, mas, como sempre, eu me privei de fazer isso com um
pedido sincero de desculpas.
Qualquer dia desses eu tenho que pedir para Nana fazer
alguns sanduíches para eles, quem sabe assim eles vão me perdoar.
Eu ainda não contei aos outros do que aconteceu ontem.
Quero que seja uma surpresa. Normalmente eu correria para casa para poder ter
certeza que nada aconteceria com Shizuka enquanto eu estivesse fora, mas hoje
me dei ao luxo de esperar quinze ou vinte minutos a mais.
'"Hoje eu vou demorar um pouco mais. NÃO DEIXE que nada
aconteça com você, me entendeu?". Eu saí de casa por volta de dois períodos
atrás deixando essa mensagem para ela. Força, onee-chan.
Eu avistei ao longe uma garota de cabelos negros, parada
nos jardins da escola. Eu desci as escadas correndo para ir até onde ela
estava.
— Yami-san!
Ela me notou quando eu a chamei, parou de mexer no
celular, e olhou para mim. Como sempre, a sacola do violão estava nas suas
costas.
Eu não sei se já tinha notado isso, mas ela é do terceiro
ano, assim como eu. Pelo visto somos de turmas diferentes... Eu não acho que
ela seja da turma de Akakyo e Kaioshi, também.
— Vamos fazer a audição hoje?
— Sim, eu já falei com todos. Estão te esperando na sala
de música.
— Entendi. Vamos.
Ela se mostrou bem confiante enquanto falava e caminhava.
É claro. Ela era incrivelmente talentosa. Ela até poderia tentar ser humilde se
quisesse, mas aquilo simplesmente era algo incontestável.
Não demorou muito para chegarmos na sala de música. Eu
abri a porta de correr, chamando a atenção de todos os outros membros, que já
estavam lá. Atrás de mim, depois de eu entrar, entrou a garota de cabelos
negros. Eu ouvi o assovio inconsciente dos dois garotos. Aparentemente Yuragi
também ouviu, visto que ela lançou um olhar cortante na direção deles.
— Boa tarde. Meu nome é Kurou Yami.
— Ho, ela tem boas maneiras. Por que não vemos o que você
faz, garota?
Yuragi cruzou os braços e lançou o típico sorriso
desafiador para ela. Yami simplesmente fechou a porta e manteve a expressão
calma enquanto subia no 'palco' na frente da sala.
Eu fui me sentar junto com o pessoal, no canto direito da
sala. Os garotos olharam para mim, meio inseguros.
— Ei, Makoto, ela não está aqui para tentar nos matar pelos
ouvidos como ontem, está?
— Haha... Vocês também ficaram traumatizados, não é?
Como resposta, Nekogami e Osakura tiraram dos bolsos os
mesmos protetores de ouvido que os candidatos estavam usando ontem. Por algum
motivo Yuujimura também estava usando os dela. Na verdade, agora que eu olhei,
Yuragi também...
Eu tirei um protetor da orelha de cada garota e falei
normalmente.
— Vocês não vão precisar disso. Apenas relaxem.
Os quatro olharam para mim, ainda incertos, mas eu olhei
confiante para o 'palco'. Lá, a garota de olhos vermelhos havia tirado seu
prezado violão da capa, dedilhando algumas notas aleatórias enquanto se
preparava.
— Então... Posso começar?
— Sim, vá em frente.
A garota fechou os olhos e respirou fundo. O som que se
sucedeu saiu das notas bem aplicadas do violão. Pelo que notei do olhar de
todos, eles estavam pensando: 'pelo menos, se ela não souber cantar, pode tocar
alguma coisa'.
Mas a voz que veio depois foi além da expectativa de
todos. Até das minhas.
Ela havia cantado por menos de dois minutos, mas foi o
suficiente para deixar todos nós boquiabertos.
Novamente, eu estava sem palavras.
— Incrível... Incrível! Isso foi... Quero dizer... Ela
não está usando um gravador, está?
— Não, aquilo realmente é a voz dela... Você é ótima,
Kurou-san!
Os ruivo concordou com o alvo quanto a performance da
garota. Hanabi entrelaçou os dedos e se inclinou para frente, com os olhos
brilhando. Aquilo falava por si só. Yuragi ainda estava estupefata. Paralisada
seria mais exato. Ela estava ali, de boca aberta, olhando para a garota. Um
levantar repentino. Yuragi caminhou até a onde a garota estava, apoiando suas
duas mãos nos ombros dela.
— Kurou...
— ...?
— Entre... Na Rakuen!!
Ela olhou para a outra garota com um olhar determinado
a convencê-la, mesmo que tivesse ir até os confins da terra.
Por favor, alguém diga para ela que é isso que ela
estava querendo fazer desde o início...
— S-Sim...
— Ótimo!! Está decidido então! A partir de agora, nós
temos um sexto membro!
Yuragi colocou o chapéu militar - que ela
criativamente passou a chamar de chapéu da líder da banda - e apontou para onde
estava a concentração de pessoas na sala.
— Vocês! Onde estão suas maneiras! Se apresentem!
— Sim!
Nós respondemos num coro unânime e fizemos uma fileira
na frente da sala. No processo eu fiquei imaginando se não estávamos dando moral
demais para Yuragi fazendo aquilo... Bom, é uma ocasião especial, então eu vou
relevar.
— Membro número 002, Nekogami Akakyo!
— Membro código 003, Osakura Kaioshi!
Os dois primeiros responderam com um uma continência e
um tom alto que lembrava um exército sendo treinado ali. Eu me abstive e apenas
falei com um sorriso sem graça.
— Membro 004, Alkaev Makoto... Já nos conhecemos.
— Membro codinome 005, Yuujimura Hanabi! Prazer, prazer!
Claro, a garota-loli de cabelos negros não perderia a
chance de continuar o entusiasmo dos outros dois. Esse não é seu codinome,
sabe?
Yuragi ajeitou o chapéu e sorriu.
— E eu sou a líder desse esquadrão! Membro 001,
Nekogami-Yuragi. A partir de hoje você vai receber o número 006, e será
reconhecida como um membro desta banda! Contamos com você!
Yuragi estendeu a mão para a garota para firmar o
trato. O olhar me disse 'o que eu estou fazendo aqui? Já estou arrependida'. Eu
senti pena dela, mas não havia muito que ela podia fazer. Afinal, após o meio
segundo que Yuragi esperou para ela apertar a mão, a ruiva já havia agarrado a
mão da morena e balançado forçosamente.
Não teve outro jeito: Todos rimos.
Mas algo estava, vez em quando, me tocando o
pensamento.
Aquele dia... Era amanhã.
— Ei, líder.
— Hm, o que foi?
— Amanhã eu não vou poder participar das atividades
do clube.
— Hã!? Por quê!?
— Eu tenho algo para fazer.
Eu sorri, tentando disfarçar o que estava por trás das
minhas palavras. Todos olharam para mim, se perguntando do que se tratava.
Mas, como sempre, havia algo no olhar da garota de
olhos vermelhos que via um pouco mais fundo dentro de mim.
. . .
Aquele dia chegou.
Eu não quero deixar Shizuka sozinha... Não hoje. Por
isso, faltei à escola.
Não conversamos muito. Normalmente eu não deixaria
isso transpassar, mas hoje Shizuka realmente viu meu semblante abatido. Eu
podia ver isso nela também. Ela que sempre tinha olhos vivos e alegres apesar
de não poder se mover. Sempre um sorriso compreensivo apesar de não poder dizer
nada para mim. Naquele dia em especial, Shizuka também estava triste.
. . .
As rodas da cadeira fizeram o típico barulho abafado
ao passar sobre o caminho feito de pedra.
Felizmente a limpeza daquele local estava em dia e a
neve não atrapalhou nossa caminhada. O sol estava bem agradável também, como
ontem.
Eu olhei os inúmeros monumentos de pedra pelo caminho
a medida que passava. Ali, memórias de pessoas que outrora sorriram, riram,
viveram. Aquele lugar é onde as memórias daquelas pessoas, sempre preciosas
para alguém, descansavam..
E não podia ser diferente para vocês, não é?
Mãe...
Pai...
Eu e minha irmã paramos na frente de duas lápides em
especial. Nelas, haviam alguns escritos que indicavam o nome dos mortos. Ivan
Alkaev. Shinohara Asami. Eu lembro que a família de minha mãe pediu para que
ela fosse enterrada com o nome de solteira dela. Não que eu me importe muito
com isso.
Eu fui até a lápide do meu pai e limpei um pouco de
neve que havia se acumulado em seu topo.
— Você deve estar com frio, não é, pai?
É claro que não. Aquilo é uma pedra, Makoto. Não seja
estúpido.
Ainda assim, aqui eu estou. De frente a duas pedras
como se fossem meus pais. Meus pais que nunca voltarão para mim.
Os corpos deles nem mesmo estão enterrados aqui. Eles
foram cremados, as cinzas devolvidas às suas respectivas famílias. Por quê eu
estou aqui, afinal de contas? Isso são só duas pedras com os nomes deles.
A resposta não é tão difícil assim... É por causa
dela.
Eu olhei para a garota de olhos azuis ao meu lado. Os
cabelos flutuavam ao tocar o vento frio que passava por nós. Seu olhar estava
triste, distante. Eu peguei a mão direita dela e a trouxe para a altura do seu
ombro esquerdo, segurando-a. Ela sorriu.
Eu estou com você, Shizuka.
. . .
— Shizuka.
Um lugar misterioso, feito de completo branco. Meu pai
estava na mesma posição com minha mãe. A mesma que eu estou agora com minha
irmã. A barrida da mamãe estava grande. Sim, o nome que ela chamou foi para a
pessoa que estava lá dentro.
— Ela é tão quietinha aí dentro, não é? Esse nome é
perfeito. O Makoto chutava o tempo todo!
Eu olhei para o lado. Lá estava um berço, um bebê
dentro. Era eu, menor. O eu de agora estava vendo aquela cena de um angulo
completamente diferente, como se fosse um fantasma.
Não tem como isso ser uma memória de verdade. Eu era
muito pequeno. É apenas uma invenção da minha cabeça?
— Ei, Makoto.
A voz da minha mãe me chamou, mas ela estava olhando
para o bebê no berço.
— Essa é sua irmãzinha, Makoto. Você tem que cuidar bem
dela, tudo bem?
Eu não respondi. Eu era um bebê, não podia entender o
que minha mãe dizia. Meu pai se inclinou para frente e falou comigo também.
— Não se preocupe. Nós vamos estar sempre juntos. Vamos
cuidar dela junto com você.
Meu pai deu um sorriso despreocupado. No mundo real,
eu apertei a mão de Shizuka com um pouco mais de força. As lágrimas se formaram
no meus olhos.
— Mentiroso...
. . .
Minha irmã olhou para mim, sem entender o que eu
estava falando. Ou quem sabe, ela entendesse perfeitamente.
Não posso deixa-la me ver chorando. É minha tarefa.
Ser a força dela. Ser forte para que ela possa se apoiar em mim, depender de
mim.
Eu virei o rosto rindo e enxuguei as lágrimas, para só
então me voltar para ela com um sorriso.
— Não é nada, Onee-chan. Vamos ficar só mais um pouco,
tá bom?
Ela concordou e voltou a olhar para as lápides. Eu não
consegui mais olhar para aquilo, então me distrai prestando atenção em qualquer
outra coisa pelos próximos minutos.
. . .
Nós rumamos em direção à saída do cemitério. Passamos
menos de meia hora aqui. Hoje é o dia em que nossos pais morreram... Em outras
ocasiões não vimos aqui. É apenas doloroso demais. Estou feliz que finalmente
estamos indo embora.
Mas o destino novamente me fez cruzar caminhos com
aquela pessoa.
Na porta do cemitério, estavam um grupo de quatro
pessoas.
Era um homem mais velho e três jovens. Um garoto e
duas garotas.
Todos de cabelos pretos que brilhavam ao sol que subia
lentamente. Eu os reconheci por ser a família Kurou.
Em momento nenhum parei de caminhar. Apenas segui
encarando o grupo com um olhar sério. Meu olhar caiu curioso sobre a segunda
garota, a única quem eu não conhecia. Yami e ela são tão incrivelmente
parecidas que acho seguro dizer que são gêmeas. A única diferença é que, ao
invés dos profundos olhos vermelhos da irmã, aquela outra garota tinha os
mesmos olhos negros e frios dos outros dois homens.
Nos aproximamos alguns metros, aponto que, agora,
estávamos apenas a alguns passos uns dos outros. Eu e Yami trocamos cumprimentos
comedidos com o olhar, e iríamos nos cruzar sem dizer mais nada.
— Alkaev.
Uma voz masculina imponente chamou pelo meu sobrenome.
Eu me voltei para o homem mais velho. Ele devolveu um olhar ríspido e
perfurante para mim. De alguma forma, era como se ele estivesse olhando para um
odiado inimigo.
— Seu olhar continua desagradável.
Com aquelas palavras enigmáticas, ele se virou e
continuou caminhando. Meus olhos continuaram os mesmos desde a última vez. Meu
olhar também, até onde eu sei, não mudou.
É um olhar que te despreza.
Eu passei pela garota idêntica a Yami. Ela nem mesmo
me olhou, mantendo sua direção fixa nas costas de seu pai o tempo todo, sem se
abalar. Ela parece ser uma pessoa calada e fria. Faz bem ao tipo desta família.
O próximo foi o garoto que me acertou com a espada. Eu
esperava que ele fosse fazer algum comentário hostil como o pai, mas o que ele
fez foi parar de caminhar e olhar um pouco para baixo dos meus olhos. Olhar
para minha irmã.
— Meus pêsames pela sua perda.
Apenas com essas palavras e sem esperar pela minha
resposta, que nunca viria, ele se virou e seguiu com os outros dois. A garota
dos olhos vermelhos parou ao meu lado, observando os outros três irem embora.
— Você não vai com eles?
Yami não me respondeu. Ficou olhando para o grupo que
se afastava, como se esperasse por alguma coisa. Eu olhei também. Lá no fundo,
o pai dela virou o rosto de lado, encarando a filha com o mesmo olhar frio e
odiável com o qual tinha me encarado não muito tempo atrás. Yami torceu o lábio
e deixou a franja cair sobre o rosto.
Quando eu me virei para a garota de olhos vermelhos,
ela agarrou meu braço e me puxou para o lado oposto.
— E-Ei!
Eu me equilibrei de forma a conseguir empurrar o carro
de Shizuka com cuidado. Nós começamos a sair do cemitério.
Eu não sei se o pai dela continuou olhando depois
disso, mas, se eu tivesse que chutar, diria que ele apenas tinha olhado para
frente e seguido em frente, sem se importar com a presença ou não de sua filha
ao seu lado.
. . .
— Yami-san.
Eu chamei pelo nome dela. Já havíamos parado de
caminhar faz alguns segundos. De longe eu ainda posso ver o cemitério. Shizuka
me olhou com indagação, mas eu também não sei muito o que dizer sobre isso. Eu
me virei para a garota de cabelos negros em minha frente. Ela estava respirando
para recuperar o fôlego.
— Desculpe.
— ..?
— Acho que estou usando você como fuga...
Algo me disse que a fala dela não foi apenas sobre
esse fato isolado. Em outras palavras, mesmo o fato de ela querer entrar na
banda ou falar comigo significa que ela está me usando para fugir de algo?
— Não, eu não me importo.
O silêncio reinou por mais alguns momentos, enquanto
não olhávamos para lugar nenhum em particular. Quem será que ela veio visitar,
aqui? Melhor perguntar.
— Então...
— Você veio visitar seus pais, não é?
Como se, mais uma vez, lesse minha mente, aqueles
olhos vermelhos me decifraram completamente. Eu apertei os dois apoios para
empurrar da cadeira de Shizuka e desviei um pouco o olhar.
— Bom... Sim. Como você soube?
— Por que eu estou aqui pelo mesmo motivo. Vim visitar
a minha mãe.
Ah, entendo... Então a mãe dela morreu. Mas comigo é
um pouco diferente. Hoje é o aniversário de morte dos meus pais. Suponho que
ela vem visitar a mãe dela com mais frequência... Talvez a Shizuka queira
visitar nossos pais com mais frequência também, mas seu irmão estúpido e
egoísta só trás ela aqui uma vez por ano.
— Afinal, hoje é... O aniversário da morte dela.
— Eh?
Então... Ao contrário do que pensei, ela também morreu
hoje!? Só pode ser coincidência, não é? Quero dizer, é claro que é. Não tem por
que ficar perdendo tempo imaginando essas coisas.
— Você não sabe?
Eu não sei o que dizer. Não é óbvio que eu não saiba?
Você é a única pessoa dessa família com quem eu posso ter uma conversa decente.
— Makoto-kun, minha mãe, ela...
— Foi morta.
Uma voz adulta desprezível completou a frase. Eu me
virei. Tendo minhas expectativas contrariadas mais uma vez, o homem, que pensei
ter seguido em frente sem sua filha, havia voltado. Ele mantinha aquele olhar
venenoso sobre mim e sua filha. Eu o encarei, com um semblante inabalável.
— O que você quer dizer?
— A mulher que eu amava foi morta... Pela negligência
de uma escória que chamava a si mesmo de homem. E esse homem é o seu querido
pai.
Eu dei um passo para trás, esbarrando na cadeira de
Shizuka. Eu não tive coragem de olhar para ela. Aquela notícia deveria ser tão
chocante para minha irmã quanto para mim. E pensar que ela ouviu uma coisa
dessas...
Eu falhei como irmão.
Mas isso é mesmo verdade? Meus pais... Meus pais
morreram num acidente de carro. E junto com eles... Havia um médico. Vários
flashs de notícias e jornais passaram na minha cabeça. Datas de morte iguais...
Será que... Dentro daquele carro...
Mas... Mas..!
— Não foi culpa dele! O outro veículo invadiu a outra
pista, e...
— Aquele homem assassinou a minha esposa no momento em que decidiu viajar em alta
velocidade no meio de uma tempestade! Ele brincou com a vida dela! E por causa
dessa pirralha amaldiçoada.
Não... Eu posso até não querer aceitar a verdade, se
for o caso. Posso não querer aceitar que as ações de meu pai acarretaram na
morte de alguém. Posso querer insistir infantilmente que a culpa não foi dele.
Nesse momento, não me importo que você diga que seja. Não me importa argumentar
para provar que não é. Tudo o que me importa é que, com sua língua suja...
Você...
— NÃO FALE DA MINHA IRMÃ!
Como um raio, eu saltei na direção do homem.
Desgraçado. Maldito. Meu sangue está fervendo. Tudo o
que me define é o desejo de enterrar o punho em seu rosto.
Todo o mundo girou num arco vertical, até o ponto em
que minhas costas atingiram o chão.
Uma dor aguda no meu braço e depois na minha garganta.
Demorou muito, a ponto de que eu estava quase sem ar,
para entender o que havia acontecido.
O homem havia agarrado meu braço e me arremessado sobre
o ombro dele contra o chão. Em seguida, em forma de uma garra, a mão dele
agarrou minha garganta e começou a tomar minha vida aos poucos.
Eu tentei gritar para que me largasse, mas a voz não
saiu. Meu corpo se debatia, tentando escapar da pegada do homem que me tomava,
segundo a segundo, o ar que eu precisava para respirar.
Essa sensação de novo. Pela segunda vez em dois dias
eu senti como se estivesse prestes a ter minha vida tomada de mim. Tudo que
consegui pensar foi que deixaria minha irmã sozinha, naquele mundo.
— Você tem... Os mesmos olhos dele.
Ele repetiu aquela frase que eu já havia ouvido. Então
era sobre isso... O fato de que meus olhos são como os olhos do meu pai.
Outrora motivo de orgulho, agora uma dúvida invadia meu coração. Meu pai realmente
matou alguém? Realmente foi culpa dele? Eu não sei mais...
A vida entrou de volta no meu corpo quando o homem
largou minha garganta. Eu respirei e tossi pateticamente em busca da
consciência que estava prestes a perder.
Que droga... Esse homem... Com ódio no meu olhar, eu
declarei uma sentença que nem mesmo sei se seria capaz de cumprir. Mas tudo
dentro de mim dizia...
Eu vou mata-lo.
Água. Água escorreu pela minha testa e pelos meus
olhos. Era uma mistura de chuva e lágrimas. O homem saiu caminhando e me deixou
deitado sobre a terra molhada. A sensação de frio do inverno imediatamente
invadiu meu corpo. A chuva era composta da mistura incomum de neve e água, que
deixava meu corpo totalmente sujeito ao frio. Na minha frente, ali estava Yami,
abraçando a cabeça de Shizuka, que provavelmente estava chorando agora. Ela
devia estar ali desde o momento em que eu entrei em embate com o pai dela,
protegendo a minha irmã de ver tudo aquilo. Uma função que deveria ser minha.
Eu realmente... Falhei como irmão.
— Makoto-kun, temos que sair daqui, ou vamos ficar
doentes.
Eu agarrei um punhado de neve e terra, em ódio a minha
própria fraqueza.
— Makoto-kun!
Eu sei... Eu sei, droga!
Eu abri meus olhos, vendo o céu que outrora estava
ensolarado, agora, repentinamente, completamente nublado e negro.
Aquela era... A verdade.
. . .
A neve continuou a cair em mim, sem dó,
sem piedade.
Na escuridão desse mundo apertado, tudo
o que eu posso fazer é esperar.
Esperar pelas pessoas que estão tentando
me salvar.
Esperar que a neve que cai tenha um
pouco de misericórdia.
Mas o fato é que eu estou evitando
aceitar a verdade.
A verdade de que eu nunca vou sair
daqui.
. . .
Chiharu - 14
Verdade.
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